terça-feira, 16 de novembro de 2010

TRAVESSIA SERRA DA BABILÔNIA

A aventura toda começou na minha casa mesmo, sempre apreciei muito as montanhas daquela região e sempre quis montar uma excursão pra lá. Após analisar muito, fazer vários cálculos e mapear várias vezes o caminho, resolvi me aventurar naquelas montanhas, chamei algumas pessoas que não animaram muito pelo tamanho da aventura, então fui sozinho...
A previsão do tempo não estava a meu favor, indicava muita chuva e tempo instável, fui assim mesmo.
A viagem começa no trecho que fiz de carro entre Juiz de Fora e Coronel Pacheco, sai de casa umas 8 h da manha e exatamente as 9 h estava em Coronel, dei sorte pois pegaria um ônibus às 9:15 com destino a Goianá, e foi o que fiz. Cheguei em Goianá por volta de 9:35 h, dei uma paradinha para ajeitar a mochila, comprar água, pegar umas informações e finalmente pé na estrada.

1º DIA:

O inicio foi bem tranqüilo, subidas e descidas bem suaves, o único problema era a chuva que batia no rosto e incomodava um pouco, mas enfim, não era isso que ia me deter. O barro também era problema, a estrada escorregava bastante. Fui andando e os problemas começaram a aparecer, a alça da minha mochila (25kg) tava me “coando” os ombros, começava a sentir dor. Eu procurava ansioso por um ponto que pudesse parar e ajeitar algumas coisas, mas não havia sequer um local para sentar na estrada, nem se tivesse daria para faze-lo pois a chuva não “deixaria”. Após um longo trecho (4,810 km) encontrei um local para parar, era uma espécie de ponto de ônibus, pra mim foi um abrigo salvador.


Fiquei ali um tempinho, comi alguma coisa e arrumei a mochila, a chuva passou um pouco e eu resolvi cair na estrada de novo, e foi isso que fiz. O primeiro objetivo era chegar em Carlos Alves, e como eu tinha mapeado bem a região, sabia de todas as bifurcações que havia na estrada, andava sempre a procura de uma delas. Chegando no pé da serra que me levaria à divisa dos municípios de Goianá e São João Nepomuceno, a chuva apertou e estava quase impossível de andar, foi aí que vi um ponto de ônibus mais arrumadinho, então aconteceu a segunda parada para abrigar da chuva.

A chuva parou, mais uma vez pé na estrada. Comecei a subir a serra, no inicio tudo foi ótimo, enfim consegui tirar umas fotos boas e apreciar um pouco a vista, já que a chuva deu uma parada e eu conseguia me concentrar noutra coisa sem ser ficar molhado. O trecho é bem cansativo, mas até que passou bem rápido, eu estava ainda com muita energia para gastar, então segui em frente. Terminando a subida chego em um trevo que descendo daria acesso a Carlos Alves, subindo iria para o topo da Serra da Babilônia, ansioso por chegar em Carlos Alves, desci sem medir as conseqüências. O trecho era muito íngreme e havia muito barro no caminho, mas eu não via a hora de chegar em Calos Alves e resolver o que ia ser de mim daquele ponto. O caminho guarda belezas que me surpreenderam a cada passo, como por exemplo, o castelo do deputado Edmar Moreira, o mesmo é simplesmente perfeito, me sentia observando uma paisagem européia.

Já em Carlos Alves (12,420km) fiz uma parada estratégica para colher algumas informações e tomar um refrigerante, foi aí que descobri que a estrada que tracei na saída dali, na verdade passava dentro de uma fazenda e era impossível chegar nela, me vi desolado pois sabia que teria que subir o trecho do castelo todo de novo, e a subida era bem forte para pegar o trevo avistado lá em cima na divisa de municípios. Procurei até algum tipo de transporte que me levasse no trevo, mas não havia ninguém, bom, já que não tem jeito, vamos a pé mesmo, e novamente peguei estrada em direção a serra. A subida me “castigou” mas o meu objetivo falava mais alto e eu não iria desistir. Esse trecho que to me referindo tem 3,660 km e era uma subida intensa, não havia sequer um trechinho plano. Parei umas duas vezes para descansar e quando cheguei no trevo mal acreditei. (16,080km).sem mais delongas, comecei a subir a serra, não acreditava no quanto eu tava subindo, agora além de muita dor nas costas (mochila), o trecho estava com muito barro e tava difícil de andar, mas eu tinha que terminar logo pois o tempo já estava “contra mim”. No final dessa subida encontrei uma construção que parecia abandonada, parece que ali era uma fabrica que não pude identificar de que, passei por ela com um certo receio de haver cães, mas não tinha nada e ninguém. Segui viagem e pouco a frente encontrei uma casa abandonada com uma pequena bifurcação, tive que parar ali e analisar o caminho, juro que pensei em parar ali para acampar, já que a casa tinha luz e água, além disso o cansaço já era tão grande que eu estava aflito para parar e descansar, mas não fiquei ali. O meu mapa e anotações me mandavam ir para direita, e foi isso que fiz, sabia que estava perto do ACAMPAMENTO I, isso me motivou a continuar e não sair dos meus objetivos que assumi comigo mesmo. O caminho era até bem tranqüilo, tirando muito barro na sola do tênis que não me deixava estável nem por um momento. Um pouco a frente achei um local que eu pensei ser o ponto base para passar a noite, fiquei super satisfeito pois sabia que o momento de descanso tava chegando, só faltava encontrar água para ter uma base segura e pode dormir tranqüilo, achei um riacho meio duvidoso e não pensei duas vezes, era ali mesmo (19,100km). Após procurar bastante um terreno plano ( que não encontrei) resolvi armar minha barraca num ponto mais limpo e menos inclinado que achei, e foi isso que fiz.

A noite foi bem tranqüila, coloquei uma lona que levei por cima da barraca, ao mesmo tempo para protege-la e para não molhar muito pensando em guarda-la no dia seguinte. Achei que ia ficar temeroso em haver animais ou ate mesmo pessoas passando no local, mas não havia nada mesmo, entrei na barraca, arrumei tudo e fui fazer minha comida (Macarrão de copinho + sopa instantânea). A água ferveu rápido e logo eu estaria comendo aquela “delícia”. Comi mais algumas coisinhas e fui deitar para faze palavra cruzada, a única coisa que tinha para fazer a noite. Após fazer uma revista inteira, fui dormir.

2º DIA:

Acordei 8:30 h e sem demorar muito fui fazer minha mochila de novo e continuar andando, as dores na perna já existiam e só de pensar na mochila as costas já doíam também. Fiz rápido a mochila, esperai a chuva estiar um pouco e dobrei a barraca com muita rapidez, tudo pronto, pé na estrada. O segundo dia tava mais tranqüilo, a chuva no inicio do dia era mais amena e dava para tirar algumas fotos interessantes, caminhei um pequeno trecho e avistei em seguida o local que era pra ser o acampamento I (21km). Um lindo lago com vários pontos de camping, e no alto de uma colina uma casa totalmente abandonada, parei um pouco nessa e após lamentar muito não ter chegado ali, tirei umas fotos e segui caminho, não queria perder nenhum segundo.


A estrada que caminhei logo após a casa abandonada era muito bonita, passava beirando um vale e a paisagem era deslumbrante, aproveitei que tudo estava bom e tirei muitas fotos desse trecho.



Tudo dava certo, eu estava satisfeito pois estava saindo tudo dentro do que eu planejei, estradas, bifurcações, tudo nos conformes até passar o próximo ponto. Eu tinha que passar no meio de um vale e atravessar umas montanhas para chegar na estrada que me levaria á fazenda Sant’Ana, estava tudo nos planos se a estrada que tracei não tivesse sumido no meio do mato. Este momento fiquei desolado pois via meus planos irem por água a baixo. Mas como sou persistente, resolvi me aventurar e tentar achar pelo menos um “caminho de boi” que me levasse ao ponto desejado, subi um morro meio íngreme, me agarrando em mato e escorregando muito, nessa hora chovia muito de novo e parecia que eu estava entrando “numa gelada”. Quando cheguei no alto do morro, uns 50 mts acima da estrada, vi que realmente não havia nada, sentei numa pedra, a chuva caía em cima de mim, e ali fiquei uns 10 min pensando no que fazer. Bom, não tem jeito, teria que abortar a “missão” e dali traçar novos rumos, a sorte que eu me lembrava muito bem de todos os caminhos que haviam ali e tracei muitos planos de fuga, caso algo desse errado, sabia que se continuasse a estrada sairia na estrada de volta à Goianá. Desci o pasto e segui a estrada, com novos objetivos na cabeça e procurando um lugar para passar a segunda noite.

No meio do caminho de longe vi uma bifurcação e quando olhei pra cima, tive a impressão de ter visto um ponto de foto da estrada de Sant’Ana, não pensei duas vezes, “rasguei” pasto acima e nada me detinha, estava cansado, molhado, com fome, mas meus objetivos sempre ecoavam no meu ouvido, tenho que conseguir! Chegando no alto do pasto, percebi que havia uma mata fechada e que cada vez mais eu me afastava do que eu queria, chegar na estrada de Sant’Ana. Vi uma trilha entrando na mata, imaginei que poderia me levar até a estrada e entrei na trilha, após andar um pequeno tempo dentro da mata fechada (20 min) sai num ponto que ficava exatamente 30 mts onde entrei. Não precisa dizer que fiquei “P. da vida” né!

Desci o pasto e cheguei perto de umas casas, sem demorar fui de encontro às mesmas e me pus a chamar por alguém. Uma senhora, muito idosa saiu de uma das casas e veio ao meu encontro, conversei um pouco com ela e resolvi andar um pouco mais para tentar achar um local de camping, não sabia mas estava dentro da Fazenda bom Jardim. Uns 200 mts da casa da Dona Maricota achei uma outra casa, resolvi chamar novamente alguém e nenhuma resposta obtida, cheguei mais perto da casa e vi que estava abandonada. No fundo da casa tinha uma varanda bem protegida, após ver que não havia bicho, resolvi entrar ali e armar minha barraca, montava então o ACAMPAMENTO II (28,500km).


A estada naquele lugar foi interessante, “do nada” apareceu um trabalhador da fazenda (Valter), me fez algumas perguntas e acabou ficando ali batendo um papo, estava acompanhado da esposa e filhos, queria saber tudo, de onde eu era, onde eu trabalhava (principal indagação), o que eu comia, como tudo cabia na mochila, entre outras coisas. Ficaram ali um tempo, e logo após foram para casa, o Valter ainda voltou me trazendo jantar, é claro que aceitei de muito bom grado, alias, estava uma delicia.

Acendi o fogão a lenha e fiquei por ali mesmo, fazendo Capuccino e comendo algumas guloseimas que havia levado. O sono foi chegando e eu resolvi me recolher. Deitei e fiz outra palavra cruzada, quando esta chegou ao fim, dormi.

No dia seguinte quis acordar mais cedo pois o Valter tinha me dito que me levava de charrete até Goianá, fiquei empolgado pois iria “economizar pernas” e ainda ia passear de charrete, quando cheguei na casa dele, a esposa me disse que ele havia saído a pouco com o encarregado da fazenda, foram para a lida, me via de novo na situação de desolamento, sabia que teria que ir a pé dali à Goianá, sem muito o que fazer, segui viagem.

O ultimo dia é interessante, pois tudo que nunca doeu na sua vida, resolve doer ali, meus tendões calcâneos estavam “arrebentados”, minhas panturrilhas não “existiam” mais, as costas nem se fala, tudo era dor, muita dor. Mas tudo valeu a pena com as paisagens que tive nesse ultimo dia, não caiu uma gota d’água sequer e eu pude aproveitar bastante a viagem.


O trecho em questão não era pequeno, somando tudo daria 8,800 km para andar ainda, foi muito difícil mesmo, mas quando estava chegando em Goianá novamente (36km), a felicidade e exaltação por ter conseguido vencer meus medos e desafiar meus limites mentais e físicos, estavam vencidos. Tive medo de não conseguir, senti frio, dormi molhado, andei molhado, comi mal, não tinha o que beber as vezes, cai no chão diversas vezes pois havia muito barro no caminho todo, meu corpo era só dor, mas no final das contas a certeza que tenho é que eu posso vencer os obstáculos, prosseguir no caminho e se não der certo pegar um outro caminho, as vezes mais eficiente e que levará no mesmo lugar, de repente até um ponto mais adiante. Lições que ficam de uma aventura tratada como “loucura” por muitas pessoas, mas dela tiro uma conclusão para minha vida, alias, duas, a primeira que este é meu mundo, minha vida, amo muito isso, e a segunda é que não troco isso por nenhuma balada no mundo!!!!

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